Casal faz campanha por exame após perda de bebê

Tragédia poderia ter sido evitada com um simples exame; sem ele, bebê contraiu infecção e morreu.

Uma tragédia que poderia ter sido evitada com um simples exame, o exame de cultura do estreptococo B (streptococcus B), feito em gestantes. Sem ele, o filho do casal Alexandre Marcon e Daniela Tiengo Bugno, que nasceu com 3,4 quilos e supersaudável, em 7 de janeiro deste ano, contraiu uma infecção e morreu no dia seguinte. Agora, apesar da dor, eles decidiram que vão lutar para que essa história não se repita.

Alexandre e Daniela mostram a foto do filho que morreu de infecção

O pré-natal de Daniela foi normal e ela fez todos os exames pedidos pelo médico. O casal vive em São Paulo, mas Daniela, que é piracicabana e tem família aqui, escolheu a cidade para ter seu filho. Com a filha do casal, de 9 anos, foi assim também.

No dia 6 de janeiro deste ano, ela chegou para uma consulta de rotina – estava com 38 semanas de gestação -, mas o médico perguntou se ela não queria ficar, já que estava com dois dedos de dilatação.

“Ele disse que ia nascer até as 7h do dia seguinte”, lembra Marcon. Daniela foi internada e teve seu filho à 1h39 do dia seguinte, 7 de janeiro. Era um bebezão, com 3,4 quilos e 50 centímetros. Duas horas depois o neném estava no quarto.

“Comentei com ela: “Nossa, parece que esse bebê já tem uma semana. Aí entrou um pediatra e comentou que o neném não era 9, era 10 (nota que os médicos dão para dimensionar a saúde da criança)”, lembra Marcon.

Drama

Poucas horas após o parto, o casal achou o comportamento do menino estranho, já que ele não chorava, apenas resmungava.

“Coloquei para mamar, ele não quis”, disse Marcon. Após o banho, por volta das 6h, Daniela tentou alimentá-lo, mas ele não quis. Uma enfermeira chegou no quarto, pegou o bebê, viu que ele estava babando e decidiu levá-lo para a enfermaria. Isso aconteceu por volta das 11h. Daniela foi informada que o bebê vomitou e estava com falta de ar. Achamos que era um negócio bobo. Aí é que começou a história”, disse Marcon.

O médico pediu exames, de sangue e raio X. “Quando veio o resultado já tinha trocado o pediatra, e ele disse que o bebê estava com uma infecção muito forte”, contou Daniela, em meio a lágrimas. Os dois lembram que pessoas entravam no quarto e faziam perguntas.

“Queriam ouvir que o problema dela tinha ocorrido antes do parto”, acredita Marcon. “Fizeram perguntas do tipo ‘ela chegou com a bolsa estourada? Demorou para nascer?’. Aí uma pediatra deixou escapar: ‘Ele (o médico obstetra) pediu o exame de estreptococos B?`”.

“Gravei a palavra”, contou Marcon. “Ah, não pediu, não fez?” A cara dela dizia: “Não acredito que isso aconteceu aqui dentro!”, continua ele.

Segundo Marcon e Daniela, eles nunca ouviram falar do exame, mas descobriram depois que em São Paulo todos conhecem.

Daniela lembra do momento em que os médicos decidiram levar o filho deles para a UTI, porque o caso era grave.

À meia-noite mandaram chamar o casal para ver o bebê e Marcon estranhou a movimentação de médicos e enfermeiros, que olhavam de forma estranha para eles.

Na UTI, Marcon tranqüilizou Daniela, dizendo que o bebê estava forte e iria sair dessa, mas desabou quando a médica disse que o caso era grave, que a bactéria é contraída na saída do parto e que poderia provocar sequelas, como cegueira e surdez, entre outras.

“Quando foi 3h, chamaram a gente e já fui sabendo que tinha ele tinha morrido”, emociona-se Marcon.

Campanha

O comerciante não quis fazer o velório do filho e, intrigado, já começou a estudar o caso em sites especializados e confiáveis. Descobriu que um simples exame poderia ter evitado toda a dor.

“A cooperativa não orienta os médicos a pedirem esse exame”, denuncia. “Se a mulher tiver, uma hora antes é aplicado um antibiótico para inibir as bactérias; se o bebê pegar, o tratamento entra na hora e ele fica bem”, diz.

Marcon também reclama do comportamento estranho de alguns funcionários do hospital.

O vídeo do nascimento do filho, após a morte, foi tirado do ar.

Duas semanas depois, quando Daniela foi buscar os exames do bebê, entre eles o do pezinho, eles não encontraram.

“Disseram que poderia estar nos arquivos”, conta Daniela. “Nunca coloquei ninguém na Justiça, mas quando ela falou dessa negativa, pensei em colocar. Mas quando vim falar com o médico, me desarmei”, recorda Marcon, sobre o encontro com o obstetra 40 dias depois.

“Perguntei: ´doutor, o que aconteceu?` Ele ficou sentido mesmo, vi que ele estudou para salvar vidas e por isso não quis citar o nome dele nem o da cooperativa médica”, diz ele, que foi informado pelo médico que em Piracicaba não é costume pedir esse exame.

“Ele está carregando a culpa e aprendeu. Eu entendo que se o médico é conveniado à cooperativa, ela tem de fazer uma portaria exigindo o exame”, afirma.

Com o objetivo de conscientizar gestantes, médicos, cooperativas e convênios médicos e a população em geral, o casal agora inicia uma campanha, com anúncio em jornal, outdoors e por meio da distribuição de panfletos informativos.

Um dos textos diz: “Você gestante desta cidade! Seu médico lhe pediu o exame de cultura de Streptococcus B? O famoso exame do cotonete? Ele é simples e indolor, o que dói é não fazer. Por falta dele, mamãe e eu estamos de luto. Recado dado!”.

“O que eu quero é que uma gestante fale que fez o exame porque viu a propaganda”, enfatiza o comerciante, que começou a campanha em Piracicaba.

“O que eu quero passar é que não é um problema com o qual a gestante deve se preocupar. Ela só tem de saber que tem e fazer o tratamento rápido”, lembra.

“Quando falam de um neném morreu um dia depois do parto, todo mundo pensa em um neném prematuro, que não nasceu saudável. Mas ele nasceu saudável, recebeu nota 10 do pediatra”, enfatiza, Marcon.

Grave

Segundo o ginecologista e obstetra Gilberto Pettan, o estrepetococo do grupo B, ou streptococcus agalactiae (EGB), é considerado o agente causador de graves infecções neonatais.

“Pode manifestar-se como pneumonia, meningite, osteomielite, septicemia e óbito neonatal”, esclarece o médico.

De acordo com o obstetra, o sistema genital feminino é um importante reservatório desse microorganismo e a prevenção reduz substancialmente as infecções neonatais causadas por ele.

“O método de rastreamento é baseado na cultura de secreção vaginal e retal, entre a 35ª semana e 37ª semana de gestação, para todas as gestantes, principalmente as que têm histórias de partos prematuros”, observa Pettan.

De acordo com Pettan, quem deve fazer a solicitação são os próprios obstetras, mas médicos de outras especialidades também podem fazê-lo, se necessário.

Antibióticos

O obstetra Gilberto Pettan esclarece que quando os exames de cultura de estreptococos B (EGB) dão resultado positivo o tratamento é feito com antibióticos.

“Quando a cultura para EGB não é realizada ou desconhecida, recomenda-se o uso de antibióticos profiláticos (preventivos) quando existirem os seguintes fatores de risco: trabalho de parto com menos de 37 semanas de gestação, rotura das membranas ovulares há 18 horas ou mais, temperatura materna intraparto maior ou igual a 38º C”, explica o obstetra, que alerta: “O parto cesárea não previne a transmissão materno-fetal do EGB em pacientes colonizadas, já que a bactéria pode penetrar através das membranas íntegras”, observa.

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