Jaqueline conta que era estuprada desde os 6 anos por homem que chamava de pai
Calada, sem amigos e com medo de qualquer pessoa que se aproximasse. A garota Jaqueline passou a maior parte da infância escondida das outras crianças. A rotina se resumia em ir para a escola e voltar para casa, no distrito de Água Fria, em Chapada dos Guimarães (65 km de Cuiabá). O maior desejo da vida era não ser mais estuprada.
Desde os seis anos de idade, a menina conta que sofria abusos sexuais por parte do homem que chamava de pai. Ele era padrasto da criança, porém morava junto com a mãe dela desde que a garota tinha dois anos e, por isso, ela acreditava que fosse seu genitor.
Os abusos praticados pelo homem, segundo a jovem, eram feitos com frequência dentro da casa onde ela morava com seus outros três irmãos e a mãe.
Para que ninguém escutasse os gritos, o padrasto costumava tapar a boca da menina. Ele praticava os atos no quarto da criança, enquanto a mãe dormia.
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“Ele me mantinha calada, porque a minha mãe dormia no quarto ao lado e não poderia escutar nada. Ele prendia a minha boca e abusava de mim”, lembra.
A menina conta que também era estuprada pelo homem quando ele dizia que a levaria para auxiliá-lo a arrumar cercas em uma região da zona rural.
“Ele dizia para a minha mãe que eu deveria ir ajudá-lo, porque eu era a mais velha entre os meus irmãos. Era tudo mentira dele, pois ao chegar ao lugar, ele me estuprava”, conta.
Ele me mantinha calada, tapando a minha boca, porque a minha mãe dormia no quarto ao lado e não poderia escutar nada
Conforme a jovem, os abusos sexuais não eram relatados a ninguém porque o padrasto a ameaçava de morte e a toda a sua família, se alguém soubesse das práticas.
“Ele falava que se eu contasse para alguém, ele mataria a minha mãe e os meus irmãos. Eu também tinha medo de contar isso para a minha mãe porque sei que ele batia nela”.
Os estupros foram constantes até Jaqueline completar 12 anos, quando menstruou pela primeira vez. A segunda menstruação, porém, não aconteceu no período esperado. Pouco tempo depois descobriu que estava grávida do padrasto.
“Quando fizeram os exames, descobriram que eu estava grávida há seis meses e meio. Nunca havia tido nenhuma outra relação com outro homem, o filho era do meu padrasto”, explica.
A gestação não foi interrompida pela jovem, que optou por ter o filho, a contragosto de muitos que a aconselhavam a abortar. O padrasto fugiu do município quando descobriu que seria preso.
Hoje, aos 21 anos, a jovem Jaqueline Divina Lechner da Silva decidiu contar a sua história. Sem medo, ela relembra a infância. Durante toda a vida adulta e a adolescência, preferiu esconder os acontecimentos. Desta vez, ela optou por mostrar o rosto e falar abertamente sobre o caso.
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“Eu decidi falar sobre a minha vida para ajudar outras garotas que passam pelo mesmo problema. Normalmente, as pessoas estupradas se escondem, porque muitos dizem que elas são culpadas pelos abusos, mas não são”, declara.
Abusos
As lembranças mais antigas que Jaqueline guarda da infância são de quando tinha seis anos. Na época, ela comenta que era estuprada frequentemente e não entendia o que o padrasto fazia.
“Ele nunca me disse nada, chegava perto e já começava a abusar de mim. Pelas minhas lembranças, os abusos começaram quando eu tinha seis anos”.
Na época, a garota morava em um sítio com a família, na região rural de Chapada dos Guimarães. Para evitar que as pessoas soubessem dos estupros, o homem não deixava que a garota tivesse outros amigos.
“Nem nas aulas de educação física da escola ele gostava que eu fosse. Ele vivia dizendo para a minha mãe que eu fazia coisas erradas, para ela me bater e não confiar em mim”, diz.
Sempre quieta e sozinha, aos 12 anos a garota começou a engordar depois da primeira menstruação. Ela, então, achou que estava ganhando peso e por isso começou a fazer regime. O sobrepeso chamou a atenção dos professores da escola onde estudava.
Jaqueline foi questionada sobre o motivo de ser sempre calada e não manter amizade com as outras crianças. Os funcionários da escola passaram a ficar mais atentos à garota, depois que ela começou a ganhar peso em um curto espaço de tempo.
Foi uma professora quem descobriu os motivos de tanto sofrimento.
“Teve um dia em que o meu padrasto disse que iria me levar para arrumar uma cerca e ele tentou abusar de mim na estrada. Uma professora passou perto de onde estávamos e viu tudo. Na hora, ela apenas observou para depois denunciar”, relembra.
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No dia seguinte à cena presenciada pela professora, Jaqueline foi à escola e os professores chamaram a mãe da garota para uma conversa.
“Eu me lembro que quando a minha mãe chegou à escola, perguntaram se ela não percebia que a minha barriga estava crescendo”.
Segundo Jaqueline, ainda na reunião com a escola, a mãe foi informada por médicos e policiais que ela era abusada sexualmente e estava grávida de seis meses e meio.
“A minha mãe parecia não acreditar que eu estava grávida. Ela só viu que era verdade quando os médicos fizeram o exame e comprovaram”, conta.
De acordo com a jovem, na época em que os estupros foram descobertos, chegaram a suspeitar que a mãe pudesse consentir com os atos, pois muitos deles aconteceram dentro de sua residência. Entretanto, nada foi comprovado.
“Chegaram a desconfiar que a minha mãe soubesse dos abusos, mas não provaram nada. As testemunhas chamadas para falar sobre o caso disseram que ela não teve culpa”, explica.
O padrasto da garota, apesar de negar que tivesse participação nos estupros, fugiu do município no dia em que foi expedido seu mandado de prisão. Ele teria ido para a região Sul do País, onde morava parte de sua família.
A minha mãe parecia não acreditar que eu estava grávida, ela só viu que era verdade quando os médicos fizeram o exame e comprovaram a gestação
Pouco tempo depois de tornar-se foragido, o homem teria ligado para a mãe de Jaqueline e se dispôs a assumir o filho da garota, se ela se casasse com ele.
“A minha mãe disse que ele poderia voltar pra cá, pois ela concederia a minha mão para ele”.
A Polícia Civil foi avisada pela mãe da garota. Quando o homem chegou em Chapada dos Guimarães, foi preso em cumprimento do mandado judicial.
“Ele ficou preso cerca de quatro anos. Para a gente, foi um grande alívio”, pontua.
Gravidez
Desde que a gestação foi descoberta, a garota foi aconselhada a solicitar na Justiça a permissão para abortar o filho, pois a autorização é concedida a vítimas de estupro. Jaqueline, porém, não aceitou retirar o feto.
“Eu não aceitei abortar, a princípio, porque eu tinha medo. Mas depois, recebi uma proposta de uma família que queria adotá-lo no dia em que meu filho nascesse”.
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Mesmo com todas as adversidades que enfrentava, a jovem não se arrepende da decisão de manter a gravidez. Ela acredita que o aborto não seja necessário em nenhuma condição.
Jaqueline declara que não interromperia a gestação de nenhum de seus filhos. Segundo ela, sua opinião é formada por concepção própria, sem ser influenciada por nenhuma religião ou teoria.
“Eu defendo que as mulheres devem manter a gravidez, mesmo que seja em caso de estupros. Independente do que a gente passar, é importante manter aquela vida. Se não quiser criar, coloque para adoção”, afirma.
Depois de decidir continuar com a gravidez, a garota planejou entregar o bebê a outra família quando ele nascesse. No entanto, depois do nascimento da criança, acabou desistindo do planejamento inicial.
“A princípio, quando vi o meu filho pela primeira vez, nem dei muita atenção. Mas depois, acabei me afeiçoando a ele. Quando a mulher foi pegá-lo para levar embora, não tive coragem de entregá-lo”, conta.
A garota criou o filho por conta própria. Sozinha, ela cuidou da criança desde os primeiros dias de vida. O município onde morava, revela, não trazia boas lembranças e por isso decidiu se mudar.
“Eu vivia morando na casa de outras pessoas, em várias cidades. Morei em Chapada, Acorizal e Cuiabá. Mas não aceitavam que eu morasse com o meu filho, por isso acabava tendo que sair das casas”, relata.
Depois de morar em diversos lugares, Jaqueline se casou pela primeira vez. Ela e o ex-marido tiveram um filho, atualmente com quatro anos.
Vida nova
Casada com o segundo marido, pai de seu filho mais novo, de um ano e meio, Jaqueline tenta recomeçar a vida. Morando em uma casa de três cômodos, com poucos móveis e escassos recursos, a jovem destaca o amor que sente pelo filho mais velho, hoje com nove anos.
“O meu filho é muito carinhoso. Ele sabe de toda a minha história de vida, mas não entende direito. Sou vítima de tudo o que aconteceu comigo, mas se tivesse abortado não teria conhecido o amor que meu filho tem comigo”, diz.
Jaqueline presta serviços como diarista e o marido faz transporte de eucalipto. Os dois são autônomos e a renda familiar varia entre R$ 900 e R$ 1.200. Ela comenta que o valor é insuficiente para manter uma vida tranquila com os filhos.
Os pequenos cômodos em que vive com a família, na periferia de Cuiabá, possuem apenas uma geladeira, um fogão e duas camas. A residência é alugada e representa o recomeço da vida da jovem, que revela carregar consigo sonhos de uma infância que nunca teve.
“Eu preciso de geladeira e fogão novos e o meu guarda-roupa está quebrado. Mas um dos meus maiores sonhos é ganhar ursinhos de pelúcia e bonecas, pois nunca tive nada disso quando eu era criança”, comenta.
O trabalho como diarista foi um dos poucos empregos encontrados pela jovem, que estudou somente até a sexta série. Ela vive com o filho mais velho e o mais novo. O do meio, de quatro anos, mora com o pai no interior do Estado.
Sou vítima de tudo o que aconteceu comigo, mas se tivesse abortado, não teria conhecido o amor que meu filho tem comigo
Quando trabalha, ela pede para levar os filhos nas casas dos patrões. Para ter um emprego de carteira assinada, a jovem diz que seria fundamental conseguir uma vaga na creche para o filho mais novo e uma escola integral para o mais velho.
“O meu filho mais novo tem um ano e meio, então não posso deixá-lo sozinho. Sou diarista porque é um emprego onde não preciso trabalhar todos os dias, pois não posso deixar meus filhos sozinhos. Tentei arrumar creche para o mais novo, mas não consegui vaga”, lamenta.
Apesar de todas as dificuldades, a moça declara estar feliz com a nova vida. Ela nunca mais falou com o padrasto e vai duas vezes por ano visitar a família, que vive em Chapada dos Guimarães.
Falar sobre tudo o que passou foi uma decisão difícil. Jaqueline somente decidiu se manifestar sobre o tema depois de ler sobre outro caso de gravidez de estupro.
“Eu li uma reportagem sobre outra mulher, que também foi vítima de estupro, que decidiu manter a gravidez. O que mais me deixou triste foi ler os comentários, em que as pessoas falavam mal e humilhavam a moça, porque ela não quis abortar”, relembra.
Sem motivos para se esconder, ela revela que por diversas vezes foi apontada na região onde morava com a família como “a garota que foi estuprada”. Depois de ter superado boa parte dos traumas da infância, Jaqueline deseja auxiliar outras mulheres.
“O meu objetivo, ao falar sobre tudo o que passei, é ajudar outras mulheres que passaram por isso. Quando você se esconde e deixa tudo isso para dentro de si, acaba se machucando muito”, conclui Jaqueline, pouco tempo depois de ganhar um ovo da páscoa do filho mais velho, que acabara de chegar da escola.
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