“Tive depressão pós-parto e tentei matar meu bebê”

Dara, 23 anos, passou pela depressão pós-parto em sua primeira gravidez, mas não sabia o que estava vivendo até que chegou ao limite. Somente após colocar a vida do próprio filho em risco que ela buscou ajuda e entendeu que sofria de uma doença e podia se tratar.

“Eu tinha tudo, minha família era linda, meu filho saudável, não tinha motivos para reclamar. Era isso que as pessoas me diziam quando eu comecei a manifestar sintomas da depressão pós-parto lá em 2013. Nem eu, na verdade, entendia a tristeza e insegurança que sentia, mas era muito forte.

Ao contrário das histórias que ouvia sobre mães que não sentem amor pelo filho, eu sentia exatamente o contrário, um amor enorme. Tão grande, que era recheado de insegurança. Achava que qualquer pessoa poderia roubar meu filho de mim”

Tinha pesadelos com a minha sogra e o bebê

“Minha sogra era a pessoa mais próxima. Ela estava em uma grande euforia pelo primeiro neto e, por isso, era muito presente, até demais. Ficava brava quando não levava o menino até sua casa, queria controlar os horários de mamar e às vezes até o pegava do meu colo. É claro que isso me incomodava.

A paixão dela pelo bebê foi o gatilho para disparar meus surtos, pois comecei a fantasiar que, no fundo, ela queria tirá-lo de mim. Isso me deixava em tal nível de desespero, que me agredia, arrancava tufos de cabelos, me arranhava e mordia, chorando até não aguentar mais.

Nos poucos momentos em que conseguia pegar no sono, tinha pesadelos terríveis nos quais ela me matava para poder ‘herdar’ meu bebê.

Eu passava por tudo isso sozinha, pois meu marido trabalhava e eu ficava sozinha a maior parte do dia. Mesmo assim, minha obstetra notou que eu estava alterada e na primeira consulta e suspeitou da depressão pós-parto. Mas eu rechacei a ideia, eu não tinha motivos para estar em depressão e devia mesmo só estar incomodada com a minha sogra.”

Tentei sufocar meu filho


“Mas era claro que não estava tudo normal. Eu passava dias sem conseguir dormir. E foi numa madrugada em claro, virada havia uns dois dias, que o pior aconteceu. Eu estava amamentando meu menino quando veio a ideia de sufoca-lo no meu seio. O raciocínio foi: se eu não o tiver mais, ele estará protegido de ser roubado e ‘ficar longe de mim’. Terrível, eu sei! Mas foi o que passou na minha cabeça.

E eu tentei. Pressionei sua cabecinha contra o meu seio e ele perdeu o ar. Por sorte, muita sorte, retomei minha sanidade em alguns segundos. Ele estava se debatendo, empurrando meu seio e na hora o afastei, em desespero.
Meu filho chorou e tossiu muito. Meu marido ao meu lado ainda dormia e eu não sabia se tinha imaginado, tido um pesadelo, ou aquele horror havia acontecido de fato.”

Meu leite secou no dia seguinte

“Passei o resto da noite em claro e nervosa. E na hora de dar de mamar de novo, às sete da manhã, meu leite não saía. Para piorar, meu filho estava com soluço e não parava de chorar. Dava para ver que sim, tudo tinha acontecido e ele estava ressentido.

Tentei deixar ele no peito por um tempo, para ver se o estímulo trazia leite, mas não funcionava. Assustada e com medo de mim mesma, liguei para meu marido, que veio para casa. Ele viu que eu estava alterada, mas não tive coragem de contar o que houve. Mesmo assim, ele ficou ao meu lado e tentou me confortar.

Ele foi até a farmácia, comprou leite e preparou uma mamadeira. Bem nessa hora, acho que por perceber que não estava sozinha, meu leite voltou a sair.”

Comecei com os antidepressivos

“No dia seguinte fui à médica novamente e contei tudo o que tinha acontecido. Ela falou que eu estava em depressão pós-parto, me receitou um antidepressivo e conversou comigo, explicando que aquilo era normal, que a doença era causada pelos hormônios e que eu não devia sentir culpa.

Comecei os medicamentos no mesmo dia e o efeito foi imediato. No começo, confesso que parecia uma espécie de anestesia. Eu parecia dopada e não sentia nada, nem emoções boas, nem ruins.
Com o tempo, fui me acostumando ao medicamento e voltando ao normal, mas mais calma, sem chorar e sem aqueles sentimentos ruins que me faziam perder a cabeça.”

Tive outro filho, mas estou preparada

“Depois de seis meses a médica reduziu a dose do medicamento e quando meu menino fez um ano ela cortou o remédio. Mesmo assim, me orientou a ficar alerta. Disse que se já tive depressão, podia voltar a ter a qualquer momento.

Há dois meses tive meu segundo filho e, dessa vez, estou completamente antenada. Minha situação também é bem melhor: eu e meu marido agora temos um negócio próprio e trabalhamos de casa, então não fico sozinha com o bebê o dia todo e tenho distrações.

Mesmo assim, comecei a perceber os sinais da exaustão e de uma tristeza que começava a me dominar. Na última semana, os sintomas pioraram e comecei a ficar mal, com crises de choro e uns acessos de raiva. Então já procurei a médica e demos início ao remédio de novo.

Na primeira gravidez cheguei a um extremo que podia ter me levado por um caminho sem volta. Aprendi que depressão não é frescura e não tenho mais vergonha de admitir o que sinto, pois entendi que pedir ajuda e me tratar é essencial não só para mim, mas para o bem dos meus filhos que amo tanto!

Entenda a depressão e a psicose pós-parto

Logo que o filho nasce, é comum que as mulheres sintam tristeza e desânimo. Segundo a psicóloga conselheira da Federação Brasileira de Psicologia Rosane Granzotto, isso é normal e se deve a alterações hormonais que a mulher sofre somadas a todas as mudanças que tem em sua vida. “Mas isso dura no máximo uns dez dias e é diferente da depressão pós-parto”.

O ginecologista do hospital São Luiz Fúlvio Basso explica que a depressão pós-parto acontece quando essa tristeza não passa e se intensifica. A doença tem como sintomas mudança no sono, no apetite, choro e desinteresse pelas atividades do dia a dia. “Mas só chorar, ficar triste, não é depressão. Acontece um desleixo e um desinteresse pelo filho também”, explica o especialista.

Segundo Fúlvio, as causas da depressão estão na soma dos fatores: existe a alteração hormonal, a mulher fica muito cansada, é privada de sono, e tem fatores psicológicos, como a perda de identidade após o nascimento do filho. Ele alerta que ao menor dos sintomas a mulher deve buscar ajuda médica. E não só ela: as pessoas ao redor devem ficar atentas às mudanças de comportamento da mãe e falar disso para o médico que a acompanha.

Em casos menos comuns, como o de Dara, a depressão pode chegar a um ponto extremo que é a psicose pós-parto, que leva a mudanças bruscas de humor e pensamentos delirantes ou alucinações. Mais perigosa, ela requer atenção imediata pois pode colocar a vida da criança em risco.

Tanto a depressão quanto a psicose têm mais chances de acontecer caso a mulher já tenha sofrido com depressão ou outro transtorno psiquiátrico, ou tenha casos na família. É importante informar tudo ao médico que acompanha a gravidez e ficar atenta aos sinais.

 

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